quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Pesar de eras



“Olá minha caríssima,

Tu não me conheces, não como eu sou em todo o meu horrível esplendor.
Mas eu conheço-te tão bem que seria mais do que um choque de minutos, abalar-te-ia todas as tuas noites em branco.

Os teus caprichos e as tuas remessas de amor não correspondido são o meu pão de cada dia.
Todos os teus modos e maneiras de ser, as tuas multiplicidades excêntricas e pequenas são gotas em folhas e folhas de papel.

Podia mesmo pausadamente dize-lo para mim ate adormecer, sei-te de cor.

As minhas célebres mentiras e jogos desejosos e carnais enfraqueciam-nos.
Cada dia as minhas banalidades sumptuosas levavam-te para aquela realidade que ambos queríamos mas que ambos sabíamos ser para além do inalcançável.

Sei que nunca estive presente naquela forma arqueada que gostavas que estivesse, aquela forma amorosa de amor mais íngreme que o carnal.

Mentia-te tanto meu amor, nas palavras que pensava serem minhas como na certeza que te dava que tudo iria durar para sempre!
E agora odeio-me, e num pesar que só eu e tu compreendemos me arrependo de cada falácia e mentira que te fazia cócegas no teu ouvido.

Mas numa coisa fui sincero, minha querida, e nisso nem todas as coisas distorcidas que disse podem apagar.
Eu amei-te em cada toque nosso, o toque só nosso e que só nós conhecíamos e conhecemos tão bem.

Naquela incrivel tarde, mirava-te de junto da minha pequena e estragada guitarra enquanto te encantavas com a maresia e o mar.

O nosso separar todos os dias em uma e outra estação de comboio era o meu malfadado sacramento.
A realidade matava-me só por saber que nunca te poderia amar sempre como queria tanto e tanto, e nesse momento, nesse momento que me faz penar ainda hoje e agora, eu deixava de te amar.

Nunca o quis, queria-te. Quero que me olhes de novo como olhavas. Apenas que desta vez, sem promessas, eu olhar-te-ia de volta.

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